A Volta a Espanha 2025 terminou em clima de tensão e controvérsia. O dinamarquês Jonas Vingegaard saiu vencedor, a estreia a vencer nesta grande prova de três semanas. Talvez a consolidação de um ciclista de topo, quiçá o segundo melhor do momento, que já venceu o Tour.

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O líder da Visma | Lease a Bike, equipa que estrve irrepreensível, ganhou três etapas, vestiu a camisola vermelha de líder durante grande parte da corrida, e selou o título de forma decisiva numa etapa de montanha, a penúltima, na Bola del Mundo.

O português João Almeida foi segundo, mostrou resiliência ao longo de toda a Vuelta, até tendo em conta as polémicas com a falta de apoio dentro da equipa, e mostrou uma grande evolução quando o desafio é trepar.

Ganhou a etapa que terminou no alto do Angliru, mas, apesar disso, não conseguiu pressionar o suficiente Jonas Vingegaard… No pódio ficou também Tom Pidcock, pela primeira vez top 3 de uma grande volta.

Nas restantes classificações, destaque para Mads Pedersen, que venceu a camisola dos pontos. Jay Vine arrebatou a camisola da montanha e Matthew Riccitello foi o melhor jovem.

Contudo, além das performances desportivas, foram as manifestações políticas que afetaram diretamente o decurso da corrida.

Protestos pró-Palestina surgiram repetidamente ao longo da Vuelta, sobretudo dirigidos contra a participação da equipa Israel-Premier Tech, em resposta ao conflito entre Israel e Palestina.

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O impacto prático destes protestos foi forte:

  • Vários percursos foram alterados ou tiveram as etapas encurtadas, como a etapa 16, que teve a subida final removida (concluída 8 km antes) devido a manifestações.
  • O contrarrelógio individual teve o percurso reduzido.
  • Na última etapa, em Madrid, o percurso foi bloqueado por manifestantes, as barreiras foram derrubadas, houve confrontos com a polícia, e a organização decidiu suspender a etapa antes do fim. A cerimónia de pódio oficial não ocorreu.

Muitas foram as críticas e, inclusive, a UCI “atirou-se” ao governo espanhol ontem, já depois da Vuelta. E com razão. Olhemos para alguns pontos:

  1. Primeiro, como equilibrar o desporto com a responsabilidade cívica? Muitos argumentam que o desporto deve permanecer à parte de conflitos geopolíticos, mas nesta Vuelta ficou claro que as tensões exteriores influenciam fortemente o ambiente interno da corrida, desde a moral dos atletas até à segurança dos fãs.

A participação da equipa israelita gerou protestos com justificações políticas plausíveis para muitos, mas também debate sobre onde começa a linha entre manifestação legítima e perturbação indevida de eventos públicos.

2. Segundo, a segurança dos ciclistas e do público foi posta à prova. As etapas foram alteradas, existiram riscos de confrontos, bloqueios de estrada, etc.

Organizar grandes eventos desportivos em contextos politicamente tensos exige planeamento, mas também uma leitura sensível do momento social. Será que a organização da Vuelta e as entidades reguladoras (UCI, autoridades espanholas) estavam preparadas para este nível de contestação

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3. Terceiro, do ponto de vista desportivo: será que Vingegaard fez uma vitória “limpa” e incontestável ou beneficiou de circunstâncias atípicas? Não no sentido de “jogo sujo”, mas do facto de que cortes de percurso ou cancelamentos podem favorecer quem já está em vantagem, ou reduzir oportunidades de reversão para quem está atrás.

Ainda assim, é inegável que sofreu. Houve partes da corrida em que esteve doente, teve que defender a camisola, vencer etapas importantes nas montanhas, o que reforça o seu mérito.

Também há a percepção pública de que o espectáculo ficou afetado. Os fãs que esperavam a cerimónia em Madrid, a festa final, a consagração, tudo isso foi barrado pelas circunstâncias. Para muitos, o troféu valeu menos por não ter tido o encerramento habitual, embora o resultado desportivo permaneça válido.

Por fim, a questão que fica no ar é: de que modo irão as futuras grandes voltas incorporar protocolos ou planos para possíveis protestos e tumultos políticos

E será que há uma responsabilidade maior das entidades desportivas mundiais para mediar participações controversas de equipas de determinados países em contextos de conflito?


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Crédito das imagens: Visma Lease a Bike X / https://x.com/vismaleaseabike/status/1961087978186371226/photo/2

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